Perfume das chamas

São várias as analogias. Para cada situação um comparativo tão vulnerável aos pensamentos que chega dar medo. Calafrios e uma sensação de estar na hora errada, do lugar errado e mesmo assim não conseguir se mexer pra sair correndo dalí.
Era o cheiro, um perfume espelhado de paraíso, que fazia pouco esforço pra terminar com minha já derrotada vontade de sair. Sim, meu inconsciente lutava de várias maneiras e com todas as armas que tinha mas tudo era inútil contra o que eu pensei estar querendo.
Bastava que falasse em seu nome, a sensação desenrolada começava a aparecer. E os batimentos confusos e descontroladamente angustiantes avisavam atentos que não tinha mais saída.
A partir daí, senti mais uma vez aquele perfume, misturado ao vermelho azulado do fogo que queimava algumas lembranças do que agora era passado. Percebi que não conseguiria deixar que fosse ainda sem que soubesse se ficaria. Restava-me sentir a sensação característica, o perfume inconfundível das chamas quase azuis queimando papeis velhos e amarelados. Sortidos de imensa clareza do que hoje eu entendia e aceitava bem. Meus olhos mergulhados no calor do fogo ardiam assim como minh’alma exausta de tanta euforia e atenção exagerada.
O que precisava, era o que tinha naquele exato momento, nada além das chamas, do cheiro das chamas que lembravam um rosto desconhecido, frio e sem maiores demonstrações de vida como aquela que virava cinzas, bem ali, a minha frente.


Eduarda Lima

história vencida

Porque você não era o que eu pensava, conseguia se pintar de várias maneiras e eu amava todas essas suas cores. Amava por pensar que eram realmente suas. Mas como os olhos podem se enganar. Como o ser humano pode ser tão vulnerável às palavras? E como pode um outro, um semelhante, manipular de tal forma a construir bons sentimentos. B-o-n-s –S-e-n-t-i-m-e-n-t-o-s, nem sei mais o que isso quer dizer. Antes essas letras não precisavam ser mencionadas pra que eu pudesse sentir. Não precisavam de um som, de um meio para tornarem-se reais. Mas só pra mim, por que a realidade – e hoje eu sei bem disso - a realidade pode ser uma mentira para uns enquanto preenche corações e liberta almas de outros.
Não que tenha só me feito mal. O processo é difícil e dolorido até que se compreenda e se aceite que as coisas são mesmo assim, desse modo. Sem maiores emoções, loucas reações que se espalham e se mesclam com a vontade da explosão. De culpar todos aqueles que estão no caminho, que estiveram por perto e todos aqueles que ainda vão chegar. O desconhecido passa a ser inimigo também. Até que a melhor das decisões é ir me afastando, afastando qualquer um, afastando os desimportantes. O isolamento começa agora e não se culpe porque a culpa é inevitável e hoje, minha. A sorte de acreditar e ser feliz, ou o azar de ser enganado para depois sofrer sem negociação, tudo meu. As fábulas começam e terminam sempre com as mesmas frases e depois de ler e reler palavras tão alheias, porém tão hipnotizantes vejo que sim,  é inegável o isolamento, não é necessário mas é inegável. Não há como fugir. Percebe quantos monstros saem dos livros e se voltam contra nós na vida real? E o resto é só resto e não faz parte do que vivemos.

Eduarda Cristina

Seu pôr do sol




Sinto a falta tua ao partir dizendo que meus argumentos tão solúveis, não se encaixam em minhas conclusões. Cada ideia minha um devaneio estranho e nada que eu diga faz você voltar a entender, voltar a pensar em mim e você, voltar atrás.

Minhas palavras tão bem pensadas não são o bastante para a sua inteligência magistral. Sua beleza encanada diz merecer mais que uma pena, tinta e papel nas mãos. Mãos frias, aquelas que um dia entre sussurros e suspiros embalaram seu rosto ao filtrar meus olhos nos seus.

Vendo você cada vez menor e longe. Tão longe que seus passos tão bem decorados já não são mais nítidos como minha memória lembrava e seus olhos brilhantes, hipnotizadoramente envolventes tecem verdades nos meus, agora embaçados. A realidade esquece o sonho prometido e eu começo enfim, a conhecer o verdadeiro eu, o verdadeiro você.

Quase sempre inconscientes as pinturas de dois rostos diferentes, opostos, desconhecidos  que se encantam, se misturam num mar de contrariedades e se precisam sem entender bem o porquê. Um porquê  tão desconhecido para ambos quanto para o resto do mundo. O que antes não era importante além da fé no amor, hoje é envergado e suave de emoções.

A necessidade involuntária da dor que escreve as páginas de um livro empoeirado, esquecido e que recorda os passos largos e fúteis mesmo que mascarados e encubados de uma alma gêmea avessa ao destino.

Ouvi sua voz dizer tão clara e amarga que o dia teria acabado. O sol se pôs enfim e minha saudade e culpa sem razão saltam como rojões em volta da solidão que me recobria.

Tentei te fazer ouvir, te fazer entender, te fazer enxergar, tentei te fazer ficar, só pelos instantes necessários para que eu fizesse valer a pena meus argumentos sem lei. Mas descobri então que não se persiste no que não se pode ver. E você me mostrou que não queria enxergar. Há indiferenças que fazem bem, reconstroem o ser. E foi sem você que aprendi finalmente o prazer de me reconstruir.

Eduarda Lima

Uma nova tarde

Leões a me devorar, um pedido de socorro não é o bastante. Escrevo. Preciso ouvir o que quero. Desfrutar da vida sem medo de ousar. Um grande e complexo problema, ainda imaturo.
O trem já vai passando, um barulho que nem mesmo a angústia desvenda. Passa longe, longe, longe, longe e a capacidade de pensar nos porquês continua  a mesma, intacta e perseverante.
Indiscreta porém cautelosa como o toque suave em meu rosto, vejo as folhas das altas arvores dançando com o vento forte. Mais exata do que nunca, mas repleta de calafrios nesse inverno seco e quente, ouvi dizer do soprar que o trem só passa aqui uma vez por dia.
A vida inteira vai caminhando como o tal trem que some no horizonte, um laranja iluminado como nunca se viu igual, é delicado.. profundo até. Delicado como as palavras que pensando em dizer só se rasga papéis e mais papéis. Ninguém vai se importar. E entre um café e outro o desperdício do sol, do tempo, das lágrimas, da tinta, das linhas é cada vez mais evidente e irremediável.
As horas se vão. O vento parece carregá-las.
Volto à janela, tudo já se foi e só consigo sentir calafrios, sono e esperança para a próxima tarde daquele inverno. Um dia de cada vez, um trem para cada tarde e um calafrio para cada desperdício. É como um telefonema que não compensa o tempo. A alternativa é esperar o telefone tocar outra vez ou o inverno terminar.

Sonhe, caminhe, viva

Entender o que estou fazendo para ser alguém é mais do que fazer alguma coisa para ser.
Embora não veja nada concreto à minha frente, costuro um caminho infindável e ambíguo para me manter viva. Sei que posso seguir por esse caminho, sei que consigo sobreviver andando e buscando e aprendendo e sorrindo e chorando. Mesmo que meus passos não estejam tão certos de para onde estão indo ou mesmo que minha intuição me guie sem volta por uma estrada diferente da que a razão deveria propor.
Não basta ter um mapa em mãos para chegar onde se pretende. O mais difícil é passar pelos obstáculos e entender o porquê de enfrentá-los, qual a real importância. A angústia pela qual se passa em cada escolha é o início de uma viagem bem sucedida. Sou humana, somos dúvidas e incertezas bem estruturadas e camufladas. Alguns com uma facilidade fascinante de interpretar as voltas e rodeios, outros de certa forma inconformados, destroem qualquer vestígio de esperança que ajudaria a continuar.
Não que seja fácil usar da esperança e vontade de chegar até um lugar onde nem mesmo um coração embrulhado de experiência sabe onde é, mas tentar e olhar em volta se importando com o momento presente, desfigurando a sombra de um dia ruim já vencido.
O que se constrói de sonhos parece-me mais razoável e possível. Ser alguém e manifestar o real sentido de um objetivo parte do princípio de querer ser, sonhar em ser. Implacável perfeição. Feita de devaneios e mistérios incontroláveis apoiados em uma verdade pessoal escondida e inconsciente. Basta olhar em volta, aprender a analisar. O primeiro passo mais seguro para uma possível vitória ou uma possível chegada é o sonho e posteriormente a análise. A emoção e mais tarde a razão, caminhando também por estreitas e incertas estradas, porém lado a lado, sem se distanciarem a ponto do risco de perda.
O final feliz do sonho da noite passada é exatamente o caminho que traçamos buscando a tal perfeição. A vida passa e passa depressa como um garotinho que corre por diversão. Rápido o bastante para que a adrenalina de se viver e caminhar intensamente, aprendendo a cada passo venha à tona e tome conta do que me acostumei a ver em mim.

Cores







Mesmo que muitos  não compreendam, não aceitando da melhor ou pior maneira possível, não aceitando de maneira alguma, meu eu, meu verdadeiro eu estava agora aparecendo. Não que fosse novo, não que fosse de arrancar surpresas dos mais próximos. Só não percebia a tal "metamorfose" aquele que nunca prestou atenção  em mim ou o que se escondeu, temendo ver as cores de que sou feita.

Um paradoxo constante, um grande paradoxo de verdades intensas. Nem eu mesma conseguia acreditar, por que então pensar que outros saberiam ver por de traz de um perfeito enigma ?  As cores em mim, em minha cabeça, coração e alma. Dentro dos meus olhos carregados de insônia e descanso.


Sou real, sou sentimento, sou a fúria dentro de mim. Meus suspiros de pavor e alegria se misturam e se contorcem ao distribuir o que sou àqueles que ousam tentar desvendar .





Ah, ciúmes




Personalidade, sim, pode até ter alguma relação com a personalidade de cada um. Eu por exemplo, apesar do orgulho, me sinto completamente à vontade dizendo pra quem quer que seja que sou ciumenta. Essa minha vontade de exteriorizar o aviso, é como se fosse uma placa ou outro tipo de sinalização alertando desesperadamente para que você não ouse nem pensar em me passar ciúmes. NEM PENSAR!
Mas quem foi que disse que esse tal sentimentozinho avesso só é fruto da personalidade? Não deixando de citar, o ciúme é também causado por algumas circunstâncias, situações desconfortáveis e que na maioria das vezes só é percebida por um lado da moeda. Normalmente pelas mulheres.
Seja qual for a relação existente entre duas pessoas, marido e mulher, namorados, amigos, irmãos, pais e filhos, em algum momento de suas interessantes vidas, involuntariamente – o que deixa muita gente nervosa – o ciúmes aparece. Simplesmente aparece. Não há como evitar um sentimento. Mesmo que você costume controlar tudo a sua volta, o máximo que vai conseguir em certas situações é tentar não demonstrar o que sente. E isso, nem sempre é fácil. Dependendo da situação em que se encontra e muitas vezes do quanto a outra pessoa sabe de você, te entende e descobre tudo o que você tem, até mesmo quando nem você sabe direito o que é, as coisas ficam complicadas. Posso dizer que o ciúmes não é uma das sensações mais fáceis de se camuflar.
Não há relacionamento amoroso no universo que já não tenha passado ou que não vai passar por acessos de ciúmes. Importante é saber se colocar no lugar. Quanto mais aberta e sincera a relação, com maior facilidade se lida com esse probleminha, quem gosta de verdade sabe que vale a pena o esforço. Ser exagerado só pra valorizar a razão que acha que tem, é bobeira. Só faz o outro achar que você é um louco descontrolado.
Por fazer parte de nós, seres humanos e diga-se de passagem, ninguém é de ferro o ciúmes pode tomar proporções no mínimo estranhas. Algumas pessoas mais vulneráveis nesse aspecto acabam vendo qualquer gesto ou palavra de outra forma – da pior possível - e é sempre bom um diálogo nesse momento. Momento histórico, claro. Quase uma D.R.
A confiança entre as pessoas só ajuda nessas horas, além do amor próprio, que não deixa o lado da discórdia vencer e te fazer pagar aquele mico provocando um escândalo.
Muitos homens , eu não disse todos, mas muitos deles passam dos limites com a imensidão de motivos que lhes provoca ciúmes como o vestido curto da namorada ou aquela roupa que na cabeça dele, só pertence aos seus olhos; a independência feminina, sabe aquele mulher que não espera por ninguém e faz o que acha que é melhor pra ela?; os amigos são sempre um problema, tanto as amigas dela que a levam pro “mal caminho” ou os amigos que tão sempre por perto com segundas intenções, as vezes até mesmo os amigos dele entram na problemática; a família dela que quer sempre a atenção toda; e o mais trágico e importunador são outros homens, a namorada sempre chama muita atenção indesejada.
Essa relação complexa e ameaçadora sempre esteve e sempre vai estar presente entre pessoas que se gostam, vale ressaltar que entre um casal por exemplo tudo pode ser moldado ao que parece mais interessante pra o bem estar do relacionamento. Ciúmes é tão natural quanto o tédio, só é preciso controlá-lo para que não se transforme em paranóia ou obsessão. E vai dizer que um pouquinho só desse mal não dá uma apimentada boa na relação?

Sobrevivente

Embora ouvisse sempre o sussurrar de milhões de vozes, famintas porém suaves, escolhi não atendê-las de imediato. Aprendi com o tempo a temer a emoção e viver desconexa e saudável. Temer a emoção, temer, emoção.
Não posso dizer que seja fácil. É com certeza mais fácil ignorá-la e fingir não ouvir ou aceitá-la e deixar que ela assuma o controle. O coração perturbado, por aquelas tais vozes descompassadas e desonestas parecem sempre mais e mais fortes. Como alguém que a cada dia se supera no trabalho ou como um sobrevivente de um acidente grave em uma praia deserta.
Um sobrevivente. É dessa forma que por de trás de cada gota de água salgada, escondida entre a parede branca e a porta de jacarandá-do-cerrado queria eu, resgatar a possibilidade de atender aos meus conceitos formados ao longo de muitos tropeços e apunhaladas. Mas como o nosso próprio conto de fadas ainda não chega por sedex, as coisas não caminham como acho que deveriam.
Saber quais ladrilhos se encaixam é quase tão difícil quanto despejar em minha cabeça o planejamento disso tudo. Guiada por emoções e sem o menor descuido de viver aterrorizada pelas pequenas ilusões que se constroem durante esse processo. Outra vez as emoções.
Incontroláveis e imponentes sobre o corpo, a mente e sobre as palavras. Irradiadas pelo vermelho da dor, da vida e da morte.
Intolerável perfeição que aflora nas piores e mais insensatas ocasiões. Desabrocha como a Amarilis, feliz e limpa, contente por ser vida e durar tanto e ao mesmo tempo tão pouco em sua beleza instantânea.
Não aprendi a controlar, mas a deixar de ser controlada e aceitar momentos em que me mostro Eu, sem mais e verdadeira. Deixando que o peso do mundo se espalhe e sem cobrança desordenada aprendi a viver e querer viver. A emoção tão imponente não deixará de ser, não se esconde e deixa de ouvir as tortuosas vozes ou se deixa vencer por qualquer florescer mudo. Sou Amarilis, Açucena, sol de verão, um sobrevivente.